sexta-feira, 17 de abril de 2009

segunda-feira, 13 de abril de 2009

Ardilheiro

Há quase seis anos que vivemos em Ardilheiro, ao pé do Pico Sacro. Foi uma volta à pátria do teimoso clã dos Pelaios.
Pela minha avó Maria, a Madrinha, a Rulinha dos meus cinco anos, somos Pelaios. Isto quer dizer que a sua mãe, a bisavó Josefa nasceu em Gastrar – outra paróquia deste concelho que agora habito -, que o irmão da sua mãe - o tio-bisavô André - veio viver para esta aldeia de Ardilheiro, que aqui nasceu a tia Consuelo – prima da minha avô - e que aqui e em Gastrar e em Compostela e em Buenos Aires e Caracas... e no mundo, mora esse empenho de fazer e continuar e ganhar partida a medos e obstáculos.
Conheci nos meus onze anos o que significa ser Pelaio. Esse mesmo dia descobri também a magia das covas do Pico: deitar uma pedra e não esconder a mão, aguardar com o ouvido acordado o som da água, da distância, da profundidade.
Nessa tarde cheguei a Ardilheiro para umas horas apenas. Lembro a imagem do coelhinho que a tia Consuelo queria dar-me, a sua meiguice, a força das mulheres grandes da família e o odor a erva e madeira deste campo.
Com trinta e três anos e dois filhos voltei. Demos nome de Terra Verde a esta casa da Zanquinha e eu passei a ser Iolanda da Zanquinha, a Mestra, Iolanda da Terra Verde, e vai saber quem…, mas sempre parte desta estirpe. Voltei e achei também vizinhos e amigos, casas abertas na casa nossa, arquitecturas da aldeia e da grei da que quero fazer parte, e entre todos, descobri Isabel.
Isabel é a voz da memória e a força da persistência, uma vontade que viaja além da dor do corpo. Isabel é a magia colectiva, a história maravilhosa deste agro com horizonte de águas e de seixo.
Foi ela quem me contou dos fenómenos que nestes lugares acontecem, advertindo-me sobre um vizinho que namorava com a natureza não apenas humana, mas também animal, e que deixara uma porca adornada com uma rolada boa de criaturas, a metade com rosto de porquinho e a outra metade com rosto de cristão. Quando perguntei pelo destino e fama daquelas criaturas híbridas, a nossa cronista respondeu, com a mais pura lógica, que bico humano não pode mamar de teta de porca e leva ao seu dono a morte certa caso de nascer de semelhante mãe.
Naquele então eu estava a chegar ainda a Ardilheiro e apenas suspeitei verdade via Macondo. Agora sei que estas coisas acontecem.
Há tempo que morreu o suposto pai daquelas criaturas.
Uns morrem. Outros nascem… Vivemos.

domingo, 12 de abril de 2009

PÁSCOA DE RESSURREIÇÃO

A cerimónia da Páscoa sempre me pareceu a mais autêntica e comunitária das propostas pela Igreja Católica. Em muitas ocasiões chegue até capelas de corpo pequenino e adro grande a celebrar a bênção do lume e da água, que sempre me pareceu uma viagem de volta aos dias ancestrais de comunidade. Na Quinta Angústia, em Compostela, naquela igrejinha que semelha pegada de aldeia na cidade, o festejo era especialmente partilhado com fogueira grande no átrio e reparto de rosca final. Esse misticismo errante perde-me e acha-me nestas comunhões .
Este ano a Páscoa abençoou a liberdade.
Foi em Boiro. No local social Aturuxo, aquela taberna com dons de tabernáculo, aquele local social com dom de convívio… Ali mesmo, com boas gentes de além e aquém Minho a partilhar música, poesia, pintura, fotografia, ensaio, perfomance, filosofia e sempre palavra. O lume da criatividade nos abençoou e a água da liberdade se estendeu. Sentia-se uma Páscoa profana a nascer de cada acto de livre compromisso e os sonhos a aboiar trás os direitos e os desejos manifestos.

Alberte Momam convidara… a Incomunidade organizou e o aturuxo foi jeito de festa ajeitado desde as palavras de Fromm, a tantas vozes.
Ressuscitaremos.

sexta-feira, 10 de abril de 2009

Voltou Sarita... o mundo voltou

Ontem saímos a passear daquele jeito grande que já quase tínhamos esquecido e que volta nestes tempos de retorno ao lar e ao comedido. Parece que a crise económica global é um incentivo para fazer uma outra coisa do consumo e consumir mais amizade, mais tempo, mais leitura, mais família e mais sorrisos. Voltamos a um sistema holístico, no que o egocentrismo do gasto plástico se anula num crédito de ruas plenas e palavras ao vento. A comunidade, a festa retornam.
Chegaram os primos, os pais, os filhos e descemos alegres até a casa de Mamã Cármen em homenagem, para que a penúltima geração dos Aldreis (alguns Aldrei já apenas na genealogia do matriarcado Lázara) beijasse a raíz que nos sustenta e tocamos a madeira da janelinha do baixo, onde o tio José Luís dourava a casa e os sonhos com santidades e corava o misticismo dos rostos com fino pincel de escarlatas.
Os átomos desembarcavam no sistema da comunicação antimaterialista e voltava o velho Aristóteles a cantar sobre Leucipo, Demócrito e Gassendi … Ah, a casa de Cármen a dos Santos tão perto do inferno proibido do Cruzeiro do Gaio… As mulheres a fazer mundo… E na Alameda as Marias a galantear César Lombera desde a maravilhosa cor do dinamismo desmandado.
Em meio da festa, do convívio, as meninas velhas sorriam. Eram três agora, como me contavam que três foram em tempo da jovem Sarita viva, as donas da cor e da anarquia. Mas duas eram, às duas em ponto da tarde, as que conheci de pequena, com as que me ameaçaram na rua do Perguntório por se perguntava demasiado, como na Praça do Pão me ameaçavam com o perigo de apanhar aqueles papelinhos mágicos que desciam a voar brancura em meio da noite, e me deixavam sem o pão da abençoada propaganda subversiva… E eu sabia que não podia ter, mas desejava ser tão subversiva e voadora como aquelas mensagens e ler, lamber palavras e liberdades. E vestir todas as cores das Fandinho... As suspeitas da meninez .
Corália (ou Corélia se Corélia é ) e Maruxa passeavam pó de arroz, carmim… A pedra triste daquela Compostela dos anos setenta tingia de bravura e festa errante. Adivinhava-se, manifestava-se a opressão na mesma força da máscara que denunciava. E um guarda-chuvas esgrimia a espada das lupárias, das Fandinho Ricart a tomar a feminidade por bandeira e reclamar o anarquismo possível no amor das donas da agulha e a solidão. Eu ficava a olhar, com medo a dizer alto como me desenhavam vontades e exemplo no subconsciente enquanto alguém puxava por mim: “Segue, são duas loucas… vão-te bater se ficas a olhar, apenas com os estudantes são amáveis”. E seguia, até a casa da avó, onde desfrutava da sua imagem venerada entre mais santos e buxos que quiseram ser santos, e clarinhos de mulher em voz ao vento… A casa de Mamã Cármen… o refúgio…
Quero voltar. Povoar o lar matricial com festa ardente. Acender a lareira. Criar gatos no pátio novamente, cozinhar sob a cambota e expor no comedor todas as imagens do tempo e as estirpes. E também na fotografia das Marias, as Duas em Ponto que foram três como Nemhain, Morrighan e Madb, a triada das deusas calaicas dos tempos escuros, e três são agora em luz, na alameda improvisada do espírito de Sarita que regressou.

A Barca

Na Ponta da Barca unem-se com tal força pedra, mar e céu que sempre há um tempo de energia para acumular e um sentido panteísta da existência para acreditar na vida mesma . A surpresa das ondas exprime uma ideia de milagre que torna mística qualquer forma de admiração.
Esse é o meu santuário no sentido mais extenso da palavra.
Nesses momentos complicados nos que a voragem das vivências levam a alagamentos amplos ou breves e a vontade se fecha entre as quatro paredes da obcecação, a Barca é uma nave de horizonte puro no que reverenciar som, luz e intensidade.
A paz de um sorriso, o alento de Gaia.

quinta-feira, 9 de abril de 2009

Meiga

Ah, sim! Tenho o cabelo vermelho. Coisas de Mariana, a cosmética e a primavera. Vontade de florir.
Uma vez que tingira faíscas um rapazinho chamou-me Margarida.
Ontem minha estudante surpreendeu da ousadia.
Outro rapazinho diz que gosta imenso.
Meus filhos falam de que semelho meiga…
E eu que antes de ontem escrevia um poema de glamour e também ruivas...
Serei agora visão completada do anjo vermelho para o Senhor Regheiro?
E o meu pai... vai-me deserdar?
Meiga? Meiguinha!
Mesmo!

Olhares

Quando olho nos olhos do meu filho Alexandre e lhe falo da cor verde clara com pintinha amarela e descrevo um campo em flor dentro do íris, ele me conta que assim são também os meus olhos, idênticos, miméticos … e este efeito espelho acontecia com a minha mãe quando olhava os olhos de Mamã Cármen, minha avô, e antes… contam que com a bisavó, Mamã Dolores. Dos precedentes nem sei , porque a história de Mamã Dolores é um clássico no que a Tataravó, rica e adúltera, a entregou a um casal de velhinhos para que a cuidassem em quanto ela respeitava os sagrados mandatos do matrimónio.
Sempre acreditei que os olhos verdes tinham que vir da rama daquela tataravó que com tanto amor salvou à filha, ainda que com tanto medo a tivesse escondido, que com tanta paixão agiu na ausência do marido e com tanto planeamento procurou soluções com a ponta dos dedos…
Alexandre herdou os olhos de uma estirpe feminina.
Alexandre herdou os olhos de uma estirpe lírica, dada à narração com passeios barrocos em meio dos relatos, tendência aos namoros profundos e sentidos, ritmo de pandeireta, fantasia pronta, magia, empenho teimoso e génio de vingança verbal, mundo em casa e casa em mundo desejado… Tantos brilhos e escuridões!
Será que tem também a memória dos olhares?

quarta-feira, 8 de abril de 2009

Formigas

Chegou o tempo mais cálido e as formigas saem de novo.
Estas da fotografia conhecemos em terras da Ulhoa, mas outras convivem connosco na Terra Verde como povoadoras de dois formigueiros grandes, ou quiçá de um mesmo com várias portinhas.
Quando era pequena tínhamos um quintalzinho pequeno a pé da casa. Num verão folgado chegou um livro que mais uma vez tinha brindado Gerardo – um dos magos da minha infância – sobre os insectos; aquele livro, Por la senda de la naturaleza: los insectos, complementava a boa colecção da que meu pai me proveio sobre zoologia, e aportava a visão diferente do investigador de campo. Assim que passei todo o tempo que podia naquele mundo no que as dimensões se tornavam de floresta para as criaturas mínimas. Observei, namorei com a vida.
As formigas eram um dos mais grandes mistérios. Acompanhava com olhares o seu percurso com a comida às costas, com os insectos mortos. Assistia às suas reuniões sobre a terra, verificava conversas e esforços. Mas, que se passava no mundo oculto?
Ficou.
Anos depois, já eu grande e responsável de um filho, muito mais cativo em tamanho do que é hoje e grande em alma como sempre foi, comprei uma dessas granjas de formigas que permitem, com as suas paredes transparentes, observar a vida em raios X. Imagino que um Guantánamo de formigas, que nos levou a conhecer intimidades e sentir culpas.
Não são os formigueiros para nós. São para as formigas mesmo.
A minha filha sabia com o instinto natural que sempre teve, com o mesmo que usa para conversar com os cavalos, e rejeitou o invento. Olhou, deixou cair, libertou formigas e areia num sarilho de desordem. E depois do incidente as formigas ficaram como sempre tiveram que viver: livres.
Queremos possuir, conhecer, estar omnipresentes… Mesmo no ínfimo mundo das formigas, como não a dos parceiros sobre a terra .

Aprender, também aprendo dos meus filhos.

Por certo, aquele cárcere de insectos era muito custoso. Tinham que importar de U.S.A.

Agora já na Europa querem fabricar. Os gringos deixam o negócio. A imagem que dá nunca foi boa e por aqui levamos mais tempo a guardar formigas e mouros mesmo.

terça-feira, 7 de abril de 2009

O Selo Violeta. De flores tenras.

"O Selo Violeta representa as sensações que a cor violeta traz para a nossa mente. Este prêmio é dado aos blogs que têm algumas das sensações da cor violeta. São algumas delas: magia, encantamento, graciosidade, magnetismo... e tudo aquilo que parece mágico".

E mágico foi achar neste blogue que se concebeu há uns meses mas veio nascer realmente agora, nestes dias, este surpreso do José António Loçano, o Txiqui, surpreso da sua presença e também do seu presente, este Selo Violeta, que dessa cor tingiu o meu sorriso. Visitar o blogue de José António Loçano çe um encantamento magnético, por isso tenho realmente que felicita-lo pelo seu mérito. Também aos autores dos blogues que me acompanham no caminho do seu presente… O demais é generosidade.
Um abraço grande.


As regras são as seguintes:

- Exibir o Selo Violeta no seu blogue com as regras;

- Indicar quantos blogue você quiser, que você considera violeta;

- Avisar os indicados, não se esqueça disso!

- Escrever dois poderes mágicos que você já imaginou ter.


Quanto aos poderes, o primeiro desejado consiste em saber olhar e ter o suficiente: suficiente saúde, suficiente pão, suficiente inteligência, suficiente lar, suficiente responsabilidade, suficientes bens para manter saldadas as minhas dívidas com a Mãe Terra, com a Vida, com quem em mim depositou a esperança de recuperar o concedido. O segundo poder consiste em dar o extraordinário: o extraordinário em amor, em talento, em trabalho, esforço, solidariedade, respeito, vontade, humildade e paz… É muito, sei… mas poderes são poderes, e ofertas acarinham-se.

Os blogues mágicos que visito, para além de Navegar é preciso e os que achei nas suas rotas, são muitos, mas vamos deixar alguns no oco da manga e pintar de violeta:
· A Arroba das Palavras
· Corpos que sonhan
· El Gato Utópico
· Ilha da Vera Luz
· MUSAMUSICA
· Música Nas Esferas
· NOVA ÁGUIA: O BLOGUE DA LUSOFONIA
· O levantador de minas
· ovnis e isoglossas
· Serpente Emplumada
· silêncio maciço
· soantes

Pele de Combo

Contam que o tempo também viaja sozinho e chega a onde há muitos estranhos, como os migrantes, como nós.
As migrações foram parte da minha vida desde que nasci e soube que Buenos Aires estava em casa a repartir lembrança permanecida, mas Buenos Aires era também de onde chegara o dinheiro para comprar a casa e vinheram as revistas, e os livros, e as cartas, as fotografias, aquelas mantilhas de fina seda , tudo desde Buenos Aires no baú do Avô ou nos correios. E escutei à minha Avó suspirar pelo seu irmão que levava no Brasil anos sem conta, e na minha aula uma menina tinha um irmão de pai alemão, porque a mãe trabalhava na Alemanha, e a Venezuela era terra conhecida - amigos lá estavam- a Suíça era nomear de tantas pessoas…e meu fatinho especial chegara com Luís e Rosa da Inglaterra, e alguém estava na Austrália e Merceditas nascera em Cuba… Por isso os velhos que perdiam memória voltavam às memórias e contavam do seu mundo grande, agora fechado entre o escasso trajecto dos passinhos.
Éramos uma terra de emigrantes e somos. Agora também somos terra de imigrantes.
O primeiro contacto foi pela via dos sentimentos, e desde o amor eros partiu ao amor ágape. Cheguei a ser Secretária da Casa Latino-Americana na Galiza, a viver vidas e conhecer tempos e partes de vida repartida… no Foro de Imigração… na mesma alma. Tornei mundo en mundo e parti para tornar o longe perto sempre.
Agora que conheci pele escura e combo, compreendo de mais perto a realidade. Compreendo os silêncios que não choram, que cantam alto porque alto precisam Caribe, abraço, natal e filho e sabem que lágrima apenas enche lágrima.
É forte o caminho de ida e vinda. Eles chegam sós e criam redes. São diferentes, somos distintos. Lamentam breve, escutam ritmos de tempo azul, moram em referência a locutórios, transferências bancárias, fotografias, saudade…
Somos diferentes, foram distintos. Lamentamos breve, escutamos ritmos de tempo verde, moramos em referência a cartas, transferências bancárias, fotografias, saudade… Somos… na memória o mesmo alento.
Na rede uma outra rede .
Se não nos enredamos, ficaremos frios como os peixes.
Por isso na pele nasceu ritmo de combo e uma nova cor café com leite.

segunda-feira, 6 de abril de 2009

Desde as Naves de Infinitos















Eu escrevia num blogue bilingue, português-espanhol. Traduzia os textos para os leitores de Latinoamérica, um outro templo do coraçao... Mas bilingue é agora uma palavra de portas que fecham para a nossa língua na Terra minha, na Galiza, berço de verbos azuis e namorados. Estou certa de que os vizinhos da Terra de Tir Nan Og, compreendem. Abro a janela às palavras galaicas e deixo voar aqueles textos que ficaram guardados na adega das Naves de Infinitos, aqui, nesta casa... desde os dias estranhos da inveria em primavera, enquanto as naves guardam teias.

Terça-feira, 8 de Abril de 2008
Equilíbrio
http://fotograturas.blogspot.com/2008/04/belas-liblulas.html
A mais tenaz felicidade: o equilíbrio.
Levar a paz do tempo.
Gozar o sabor doce, a revolução da felicidade.
Apreender na tristeza o som da dor: viver.
Caminhar sobre as águas. Continuar no frio, tornando milagre o equilíbrio.
Sentir a calidez da primavera, o céu azul, os infinitos da onda e perder-se no surpreso.
Mas voltar.


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Segunda-feira, 31 de Março de 2008
Um caminho

http://pensamentosroubados.blogspot.com/2008/03/carta-de-amor-de-uma-peregrina.html
Na minha Terra há um caminho que conduz Europa para ocidente, uma senda transitada quiçá para além da memória pelos povos que sonharam com um mundo diferente ao outro lado do mar. Chama-se Caminho de Santiago e propõe uma peregrinação longa e difícil, sem mais premio que o dos próprios passos, os pés danados, os ombros sobrecarregados pelo macuto, único haver do caminhante. Cada jornada é o conhecimento de um sacrifício e a incógnita de uma chegada; não há mais destino que o sonhado, nem mais senda que a presente e, porém não se acha um peregrino triste, egoísta ou resignado à derrota, porque o caminhante sabe que está só, mas também que transita em companhia, que pode baixar a cabeça e ver apenas a senda, mas que, se a erguer, achará olhares destemidos, que poderá procurar verdades nos olhos de cada peregrino.
Num mundo de competência, o Caminho de Santiago promete solidariedade; num mundo de mentiras, o Caminho de Santiago admite apenas a verdade de cada passo; num mundo de guerras, o Caminho é só paz; num mundo de cobardias, mostra o rumo frágil da própria humanidade reconhecida; num mundo de consumo, o Caminho empresta apenas o conteúdo de uma saca para sobreviver: num mundo de ódios, o Caminho outorga senda de amor... e quem um dia o vive, sabe-se, no seu foro interno, peregrino da vida, caminhante da república da esperança, porque o seu segredo é que não há chegada, nem desejo concedido a câmbio do sacrifício, as dificuldades vivem-se pelo mesmo desejo de se sentir e se achar, a companhia entrega-se pelo mesmo dom da solidariedade sentida e continua-se, simplesmente porque se aprende vida.
Alguém falou para mim da magia desta rota e esse brilho é conhecido por cada peregrino, mas não se trata de um poder esotérico, mas do mesmo poder da humildade, da comunhão com a Mãe Terra, com os pássaros e os galos de cada aurora, com as ervas e a lama, com a chuva e o sol do meio-dia: a magia está junto a nós, mas apenas quando nos desfazemos das couraças e sentimos a dor e o gozo dos passos com o nosso corpo ligeiro de equipagem podemos senti-la e desfruta-la, aprender, por exemplo, que trás uma encosta para acima, chegará outra para abaixo e que com o mesmo ânimo temos que empreender a subida, a baixada e o descanso, apreender que no Caminho há sendas doadas, mas que devemos seguir a que nos pertence e ter o valor de a rebuscar quando a perdemos. Apreendemos que os olhos abertos mostram mais, que a atenção é a beleza da vida, aprendemos que trás a mais dura jornada sob a chuva nos espera às vezes o mais intenso dos arco-íris, que as curvas nos impedem ver em ocasiões os objectivos, mas que, se seguimos caminhando, aqueles permanecerão e antes ou depois os alcançaremos; aprendemos que nalgum momento todos nos sentimos perdidos e que quem não experimenta essa sensação é simplesmente porque não caminha. Há neve às vezes no Caminho, mas o calor das nossas mãos pode derrete-la e os nossos passos marca-la com calidez de vida; viver e respirar quando sopra vento frio, porque algum pássaro persiste no seu canto. Atender o mais leve indício, como as pegadas superficiais ou fundas que mostram a senda na lameira e, simplesmente, recrear-se com as montanhas e as casas e as flores, com o riso de cada companheiro de caminho e o silêncio necessário em cada jornada... compartir, as botas que molestam nos pés a um peregrino podem ser a salvação para outro, o chão duro e frio, pode oferecer descanso se alguém nos dá a sua almofada para descansar a cabeça. No Caminho há rostos e vozes, experiências compartidas e auto-estima encontrada, reencontros com quem ficou atrás na jornada, ou com quem se adiantou e a medida do ser humano, construída em equilíbrio mostra que quem é o mais potente deve descansar num ponto e quem ficou atrás chegará com o seu ânimo até nós: não há super-homens, há pessoas, risos e alegrias, porque a tristeza é um poço escuro sem sendas possíveis. No Caminho de Santiago há descanso no cansaço, paz na dificuldade, vida na dor, solidariedade no encontro e fé, fundamentalmente, porque sem esperança não se poderia continuar desconhecendo o destino, mas também porque o futuro não é outro que o caminho próprio e partilhado e os nossos próprios passos merecedores, o equilíbrio de mundo externo e interno, o valor de sentir com a razão e pensar com o coração e agir com valentia e amar com cada esforço e com cada descanso, porquê, trás a seta amarela que marca os desvios podem-se perceber indícios, com a a erva crescida que, virgem de passos, marca a direcção errónea e as pegadas de cada bota que abrem experiências e quiçá, para além, o próprio odor das vivências e a mensagem do voo das aves. A magia do Caminho é, simplesmente, perder o medo a sentir a magia.
Cheguei... e apenas sei que não cheguei, que aprendi um bocadinho mais e comprovei que sei muito pouco, e, porém, respirei tanto e tão fundo! pedi apoio e moderam, senti a vulnerabilidade e a fé... e retomo agora as palavras do Caminho. A fé constrói-se ao caminhar, a paz com amor se cria e a senda tece-se em cada passo... se não se pisa... não há vereda nem rumo.

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Sexta-feira, 28 de Março de 2008

Saudade ou nostalgia?

http://ardotempo.blogs.sapo.pt/22796.html
A saudade é um sabor tenro de esperanças.
A nostalgia tem a estampa do passado numa fotografia do que não será.
Mas a nostalgia sabe-se que foi.
A saudade não se sabe se será.

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Terça-feira, 25 de Março de 2008
Infância e religião

http://www.estradar.com/2008/03/21/paixao-de-cristo-2/
Em tempos de discussão e véus, em tempos de simbologias confusas, entre o foi e o será, as procissões de Semana Santa, na Velha Europa: caducas imagens de cidadãos com o rosto oculto,que arrastam cadeias, que portam cruzes, que choram chuvas, que ferem pés ( e lembro A Regenta... lembro).Em meio, os meninos: a Verónica, o Samaritano, os pequenos confrades de passear rítmico ao som de tambores antigos.Lembro histórias: a minha mãe, que decidira sacar proveito do meu vestido de Primeira Comunhão e me passeava de procissão em procissão com o meu branco impoluto, ameaçado pelos círios dos rapazes que também tiravam lustre dos seus fatos de almirantes, marinheiros e jogavam a queimar meninas, com o lume religioso das primeiras chamadas da hormona.
Mas eu queria ser a Verónica. Aquelas roupas de cor, o pano que exibia o rosto do Cristo como uma pintura da escola, a maquilhagem no rosto, mas era por brincar... apenas brincar.
Depois descobri que podia brincar livre.Será que ainda brincam as crianças da procissão da Sexta-Feira Santa?
Será que ainda não podem brincar livres?

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Sexta-feira, 21 de Março de 2008

Dominar
http://arvoredeperola.wordpress.com/2008/03/10/tibete/
As histórias da história têm sempre o mesmo argumento.
Depredação.
Dominar terras que não são nossas, que são da terra mesma.
Dominar homens que não são próprios, são da vida mesma.
Dominar vegetais, animais... e dize-los inferiores.
Dominar mulher, por dominar humanidade.É a história do Tibete, mas é a história de cada lugar, de cada povo: o negro e o branco, o império e a colónia, o dono e o escravo, o rico e o pobre.
Assim se construi a humanidade, sem humanidade.
Mas nunca a água ficou estancada na montanha.
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Cor de Tibete
http://aproposdusable.blogspot.com/2008/03/le-tibet.html
Em morte a revolta e o silêncio dos invisíveis.
As cores da flor que nasce em primavera. Da flor natural. Da flor artificial. A vida mesma.
No Tibete algo sucede em cores laranja e vermelha. Complexa história com todas as histórias de violência, de império. Complexa aprendizagem dos sentidos no desconhecido sentir do sentimento, esse que o budismo conhece.
O Dalai Lama fala de paz e a teia olímpica deixa morte na rebelião... mas é justa a paz sem rebelião? e é justa a rebelião sem paz?

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Domingo, 16 de Março de 2008

Mulher
http://lelenalucas.blogspot.com/2008/03/o-jogo-quem-se-perdeu-mulher.html
Voltar mulher ao mundo. Calma da tarde. Ser mulher é sentar quando a verticalidade vence e a horizontalidade é lembrança. Sabe-se na entranha de ternuras e o mundo nasce na injustiça dos tempos.Deixar a história sem história e calar a palavra ou renunciar à imagem. De Maria Balteira a George Sand, o escândalo é a porta de atrás para ser. Nem todas podemos. Nem todas temos mais de uma vida para arrancar. Mas ser mulher é ser algo mais da metade do mundo e ter a outra metade para criar.

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Sexta-feira, 14 de Março de 2008
Gaulchovang

http://meridiano75.blogspot.com/2008/01/poemas-del-libro-salmos-de-la-tierra.html

Primeiro estava o mar. Tudo estava escuro. Não havia sol, nem lua, nem gente, nem animais, nem plantas. Apenas o mar estava em toda a parte. O mar era a Mãe. Ela era água e água por toda a parte. E ela era rio, lagoa, quebrada, mar e assim ela estava em toda a parte. Assim, primeiro, apenas estava a Mãe. Chamava-se Gaulchovang. A Mãe não era gente, nem nada, nem coisa alguma. Ela era Aluna (o pensamento). Ela era espírito do que ia a vir, ela era pensamento e memória. Assim a Mãe existiu apenas em aluna no mundo mais baixo, na profundidade, soa. (Ernesto Cardenal, Antologia da poesia primitiva)E do mar nasceu a terra, e da ideia a mentira, e o espaço sólido procurou tempo, e a mentira procurou à palavra, e a palavra procurou a verdade e a verdade chamou-se poesia.
Nascer na noite, vampiros, para expandir o verso longo e poder sair à rua sem o relógio de areia, ser de água nos tempos primitivos, quando a Mãe tingia as mãos do sangue vermelho do seu ventre e criava vida.
Poder ser, na utopia de um mundo inexistente, e negar-se a ter na língua mentiras de infinitos, e sofrer nas mãos feridas de ternura, mas ser. Firmemente ser.
Fica apenas o oco da poesia, o oco do Vento mal ferido no espírito do Mamo. Fica apenas o possível ascenso à Serra Nevada de Santa Marta, à contemplação do mundo, à voz xamânica do ritmo original e o búzio sempre no coração.

MENSAJE ENTREGADO POR LOS MAMAS KOGUIS A LA ASOCIACION CHAMANICA PUEBLOS INDIGENAS
Y SU PARTICIPACION EN LAS RELACIONES NACIONALES E INTERNACIONALES
Nos alumbra un mismo sol Tu necesidad es mi necesidad, Ambos tenemos sed, ambos necesitamos techo, ambos tenemos hambre, acabemos con nuestros individualismos y pensemos en las necesidades del colectivo. TERRITORIO Y MEDIO AMBIENTE El territorio es un espacio designado por los padres espirituales desde antes de la existencia material del universo. Es el lugar donde están consagradas las leyes los principios espirituales que mantienen el equilibrio. El cumplimiento de estos mandatos y responsabilidades es lo que garantiza la preservación del orden natural. Este carácter simbólico del territorio justifica el derecho que tenemos los pueblos indígenas de mantener total autonomía sobre su manejo. Reservas, áreas protegidas y parques naturales han sido conservadas por nuestras comunidades, por lo tanto no deben superponerse a los territorios indígenas. Recuperar la libre determinación indígena sobre el territorio ancestral, el patrimonio arqueológico, los sitios sagrados y los espacios que representan tradición cultural incluyendo la superficie y el subsuelo, así como el aspecto aéreo es importante para mantener la cosmovisión de nuestro territorio. Cualquier decisión para la implementación o realización de programas y proyectos en estos territorios debe ser determinada por los pueblos indígenas. Instamos a los gobiernos y a otras entidades al reconocimiento de los derechos relacionados con los recursos naturales, la biodiversidad y el conocimiento tradicional asociado a estos, evitando la realización de acciones en territorios indígenas, sin la aprobación de las comunidades. ECOLOGIA: Hacemos un llamado urgente a los gobiernos y a todos los sectores del planeta a tomar acciones firmes en estos asuntos de emergencia, para no continuar con los modelos de producción de excedentes, y retornar a las leyes naturales de emplear solo los recursos necesarios para el mantenimiento de la especie humana. La humanidad necesita restablecer su relación original con las leyes de la Madre Naturaleza, por tal razón, considerando la Agenda 21 firmada en la convención de Río de Janeiro, como el documento más representativo actualmente para la preservación del medio ambiente, así como su carácter global, convocamos a la pronta aplicación directa de acciones efectivas. Reafirmamos que una causa de los problemas actuales del planeta es el enfoque del desarrollo científico y tecnológico como lo reconoce la Agenda 21. El desarrollo bajo la concepción indígena se basa en la ley de origen que señala como recibir los frutos de la Madre Tierra con una actitud de agradecimiento y no de explotación. Se hace urgente un cambio de actitud frente a este malentendido desarrollo, instamos a realizar un paro, un alto en el camino para reflexionar y tomar más sabias decisiones. Hacemos este llamado a la toma de conciencia de la humanidad, a gobernantes y científicos de todo el planeta, ya que nos encontramos en un momento critico y de decadencia donde a la humanidad le corresponde decidir por la vida o su extinción. Especialmente invitamos a la comunidad científica y a las multinacionales para trabajar en conjunto en la reformulación del modelo de desarrollo. Sin embargo queremos manifestar, según nuestra experiencia, la preocupación por el aprovechamiento económico del conocimiento tradicional. Por tal razón, solicitamos que el respeto a nuestros pueblos se evidencie en la ausencia del uso de nuestra cultura y tradición con fines mercantilistas. Nuestra permanencia en le planeta no debe ser empleada para satisfacer intereses comerciales o particulares. En este sentido, es importante garantizar la protección, denuncia y control de las violaciones asociadas con las patentes y marcas sobre nuestro conocimiento, objetos sagrados, símbolos, nombres y recursos biogenéticos. NUESTRA LEY DE ORIGEN DICTA COMO PRINCIPIO QUE CADA ELEMENTO DE LA NATURALEZA TIENE SU PADRE O MADRE RESPONSABLE, POR LO TANTO NADIE PUEDE SER SU DUEÑO. Para continuar nuestros trabajos en la conservación del medio ambiente y en la reparación de los ecosistemas afectados, se hace necesario fortalecer nuestros pueblos con recursos y condiciones que faciliten la organización y la recuperación de nuestros territorios ancestrales, especialmente los lugares sagrados y los llamados sitios arqueológicos. Por ejemplo, en Guatemala existen aproximadamente 68.480 lugares sagrados ocupados hoy día por construcciones y en Colombia TEYUNA -mal llamada Ciudad Perdida- es un sitio sagrado de importancia, hoy día dedicado a la explotación turística. Permítanos hombre blanco, exigirles el cumplimiento de su propia ley de origen: la tabla de Moisés. Terminen el espíritu de dominio sobre las demás naciones y disminuyan la explotación de la naturaleza. Todo lo que fue dejado por nuestros padres es para generar vida, mientras que los inventos del hombre son solo para facilitar nuestras actividades o incluso para dominar, subyugar y acabar. Esta es la razón para pedirles que reflexionen sobre los resultados de la invención de las grandes maquinas, ya que nos damos cuenta que han destruido la tierra, el aire, el agua, y la vida del mismo ser humano. Así, se nos ha imposibilitado restablecer el curso natural de los fenómenos de la naturaleza y nos estamos viendo condenados a vivir en el mundo del sufrimiento y la desesperación. EDUCACION: La educación debe ser una herramienta para enseñar a los seres humanos los principios y responsabilidades en función del mantenimiento del orden natural. Es indispensable para la sobrevivencia cambiar el sistema actual focalizado en lo material, que genera valores éticos contrarios a la ley de origen. La visión mediatista desvirtúa la verdadera función y responsabilidad de la humanidad frente al mantenimiento y el equilibrio del mundo. Pedimos que el sistema educativo reforme la sabiduría ancestral acorde con la ley de origen, para que el hermano blanco reduzca significativamente los avances científicos y tecnológicos que degradan a la Madre Tierra y se inicie la transmisión y el fortalecimiento de los principios espirituales fundamentales para el respeto y cuidado de la Madre Naturaleza, y la construcción de nuevas formas de desarrollo y convivencia armónica. AUTODETERMINACION Invitamos a los organismos internacionales y a todos los gobiernos del mundo a la valoración de nuestro conocimiento tradicional y nuestro sistema de convivencia, a la conservación del derecho territorial y, a la ejecución de nuestras formas de administración, uso y conservación de los recursos naturales y la biodiversidad. Fortalecer la participación de los pueblos indígenas en la agenda mundial para la toma de grandes decisiones del planeta, a través de un organismo representativo de carácter internacional conformado por autoridades indígenas tradicionales, cuyo funcionamiento esté basado en la ley de origen, como medio de interlocución ante los organismos bilaterales y multilaterales. Participar en la Agenda 21, a través de este organismo, el cual debe fortalecer a las comunidades locales y a la unidad de los pueblos indígenas. Sus representantes deben ser designados por las autoridades tradicionales. Para facilitar el cumplimiento de la autodeterminación solicitamos a las naciones unidas, dentro del contexto de la Década Internacional de los Pueblos Indígenas del mundo, difundir a nivel mundial el mensaje sagrado de la ley de origen enviado por nuestras autoridades tradicionales. PAZ: "Arrancaron nuestras hojas, Quitaron nuestras ramas, Cortaron nuestro tronco, Pero no pudieron tocar nuestra raíz, Y desde allí retoña nuestra fuerza." Nosotros los pueblos indígenas a partir de nuestra existencia milenaria, contribuimos al tema de la paz en Colombia con el convencimiento de que la Paz no puede existir sin la ley original, la convivencia pacífica de los diferentes sectores de la sociedad colombiana depende directamente del concepto de habitar en comunidad bajo normas de vida sostenible. Es urgente trabajar por una paz, no solamente escrita en acuerdos sino real nacida de un nuevo estado de conciencia sobre la vida, que no solo se manifieste entre los seres humanos, sino también en nuestra relación con la naturaleza, porque de lo contrario habrá paz entre los seres humanos pero no habrá sobrevivientes. Para nosotros la paz no significa simplemente la ausencia de guerra, la paz es una forma de actuar, saber, crear, escuchar, pensar, hablar y vivir en armonía con la naturaleza y sus leyes. La paz viene de nuestro interior que solo puede experimentarse por la capacidad del corazón para permanecer abierto, sereno y libre de miedo. Cada persona proyecta en el mundo la paz o la discordia que tiene en su interior. No podemos crear la paz en el mundo si estamos espiritualmente por conflictos internos, odios, dudas, ira o miedos. Que se levanten...que se levanten todos, ni un grupo ni dos se queden atrás de los demás porque somos hermanos como los dedos de la mano. Que amanezca, que llegue la aurora, que todos los pueblos tengan Paz y sean felices. Ya es hora que se termine la obra. Que toquen mis melodías grandes, Que toquen mis melodías pequeñas Que suelten a mis danzantes, Que sean libres mis prisioneros, Son mis valles, son mis montañas. Nosotros los indígenas reunidos en UMUNUKUNU (Sierra Nevada de Santa Marta), nos declaramos guardianes de la paz de todos nuestros territorios; y aunque tenemos lenguas, cosmovisión, practicas culturales y espirituales diversas, nos une la ley de origen.
Asociación Chamánica y Ecológica de Colombia. Personería Jurídica 1388

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Quinta-feira, 13 de Março de 2008
Ser sufi

http://olevantadordeminas.blogaliza.org/2007/01/18/a-noite-acesa-de-bahaudin-majruh-ii-por-jose-antonio-lozano/
Majruh, sufi, homem.
Ser homem de amor não é fácil nos tempos que correm, nem nos tempos que correram desde as mais infinitas lembranças.
Quiçá procurar amor é o destino humano desde a época na que o grandioso Zeus partiu àqueles seres esféricos em duas metades, quiçá Platão confundiu o nome de Zeus com o dos próprios indivíduos.
Mas Majruh procurava amor no interior, achegou-se à rota dos sufis, saiu da cidade para o deserto, mas o deserto estava nos cárceres, nos campos de refugiados, na morte mesma e era o deserto da palavra, o deserto do amor, o deserto da revolta sem revolta interior. Não era possível naquele Afeganistão do século XX, é menos possível no Afeganistão do século XXI.
O deserto mais árido está no coração. Por isso, se coração ainda se parte: nasce a fonte do amor. Se o amor ainda importa: nasce a árvore da esperança. Se a esperança tem olhos: o sufi tem caminhos.
Majruh, desde o longe das místicas ocultas, desde a poesia dos caminhos esperados, desde a fonte do amor entre as rochas mais duras... o teu verbo chega e levanta minas, com José António Loçano...

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Quarta-feira, 12 de Março de 2008

Literaturas

http://escritorweb.blogspot.com/
Se é mar, sabor salgado, odor a iodo.
Se é terra textura escura tenra, flor de água.
Criar com papilas gustativas no tacto da caneta e estender palavras aos quatro pontos cardinais. A literatura é sentido, comunicação, verdade e cântico sempre do ritmo, porta ao infinito das memórias.
A palavra entregada é possível... A festa das palavras livres!
Há histórias em cada rosto e em cada pena. Escreve-las é semeá-las fora do hipermercado que comercia imposições de plástico, é a aposta do verbo. Procurar, para além daquele desfile, a comunhão fractal com o universo através do texto. Evocar os silêncios e pintar personagens na pessoa dos mundos novos, poros de tinta, ser de letra.
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Histórias das estórias

http://soantes.blogspot.com/2008/03/palavras-com-estrias-acabar.html

Hhakab

El-aqabe

Acabar

Da minha terra ao sul moraram povos que não terminaram, mas concluiram a fonte de sentir, de saber e de mesturar. Pode ser que acabar tenha un ar de kábala e de kaaba e de cabeça à fronte.Como poderiamos voltar a uma mística de espíritos sem que nos contem de uma guerra de conquistas e de reconquistas nesta Península perdida em ilhas diversas?Unir mundo na viagem interminável.Contam que uma vez houve uma longa história de amor com ecos orientais, com ecos occidentais. Contam que não acabou ainda e que uma cantiga com palavras romances e ecos afroasiáticos chega de algum lugar do fim de um mundo que recomeça e contam que se curva o início e acaba no ventre da mulher que leva o filho do possível... para o tempo que não acaba, desde o hhakab que predica, até o el-aqabe que inícia um outro fim de ciclos.E foi possível?... poder acabar com as guerras de tempos com uma palavra: hhakab, el-aqabe, acabar... as dores.
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Terça-feira, 11 de Março de 2008

NORTE/S

http://fogonazos.blogspot.com/2006/09/paisaje-con-familia-que-corre_14.html
E quando correm os tempos e a terra corre?
Lembro aquele comboio da infância que nos levava cada verão ao mar. Um curto percurso que suponha a viagem ao fim do mundo e o odor a sal. Sentava perto da janela e calava. Olhava tudo a correr fora do vagão: as árvores, as casas, as igrejas... Apenas as estações ficavam paradas.
Na Califórnia corriam os sinais e os carros e o mundo parava na vorágine do Norte.
O mundo ficava detido para além do rio, onde o Sul existe.
As famílias do sul corriam e na corrida jogavam a esperança. A vida mesma era a medalha sonhada na USA predicada, o mundo do glamour, onde ninguém tinha fome e todos se tornavam lourinhos.
Havia que advertir aos motoristas, fundamentalmente por uma questão de elegância, com sinais amarelos que evitassem o vermelho na carroçaria e as moléstias consequentes.
Agora aqueles sinais de tráfico são a história, mas as estradas desenham-se em presente a um e outro lado das fronteiras.
Há que correr. Atrás vem a fome.
Apenas as estações param e todas estão ao Norte... muito ao Norte.

sábado, 4 de abril de 2009

A mina

A mina de Bonaval, estou certa, embora não o tenha comprovado, tem aquela forma curvilínea da interrogação. Por isso continua incógnita anos e anos após a primeira exploração, menina eu muito pequena, que apenas chegou à boca da água e deixou até hoje a levitar o abre-boca inconsciente do subconsciente com ponto de interrogação nas entranhas da cova da que mana água na horta velha dos monges.
Estas coisas acontecem: vontades que se colocam na vida e deixam a sensação de mocidade, de coisas por fazer, de momentos por viver, de aventuras por degustar, lugares por gozar, mais coisas, muito mais… E, a medida que cumprimos projectos tornamos mais cheio o saco das bagagens e menos rapaz o chapéu das fadas que nos revolta primaveras na fantasia do que será.

Sobre as sombras a Sala Yago em Compostela

Os passos são uma visita que retorna os tempos, os posterga e imagina o que foi e o que podia ter sido, o que pode ser e o que será.
Também o cinema e teatro.
A sala Yago faz parte de passos e caminhos, do esquecido, do que talvez passou, da memória de estirpes e sonhos e também de amores fechados no tempo aberto e de ilusões e sonhos colectivos para além de um título de propriedade.
A história é comum até onde é e insólita e desde então fica na memória das utopias empenhadas.
A sala Yago está em Compostela, dizem que no centro do centro, na Rua do Vilar. Nasceu em 1946 e foi cinema censurado, cinema aberto, casa de amores clandestinos, de tardes especiais, de noivos melancólicos, de meninos com moeda na mão, de meninas com perspectiva livre. Tinha um “galinheiro especial” e uma solidão mágica na que, mesmo se o menos importante era a fita, o filme trazia cena, música, luz de sombra para o espectáculo maravilhoso dos dezanove anos, quando as mãos e os lábios são mais perceptivos que os próprios olhares. Mas quiçá o dono da velha varinha e dos rolos de imagens, o Senhor Rodríguez, escreveu já no livro da memória que as gerações perpetuam os seus próprios amores escondidos de povo grande e cidade pequena, onde todos se conhecem sob a luz amarela, e o transcorrer da história que sempre pode ser.
Lembro e confundo, confundo e lembro… quero situar neste cinema a projecção acarinhada de A Rosa Púrpura do Cairo que voltaria em Paris muitos, muitos anos depois, mas que nunca ficou no esquecimento, e antes, muito antes, as primeiras visões de aventuras que tornavam possíveis as fugidas das normas e do quotidiano.
Sim, o Cinema Yago está na minha história, mas não apenas na minha.
E sempre há sonhadores valentes que acreditam… Os monicreques de Cachirulo, O Teatro do Noroeste, Eduardo Alonso, Jorge Rey, Luma Gómez, o Kukas –o mestre particular da minha infância, mestre de rebeliões e anarquias, fotógrafo dos rostos impossíveis, pintor das palavras pequeninas- nomes e olhos de brilho e palavras de carícia pública, estavam aí ou apareceram e, quando os cinemas velhos guardavam em luz de obra todos os fantasmas reflectidos, eles aliaram-se com os personagens e tornaram-se corsários das ilhas livres, senhores do castelo, lanternas mágicas, domingos da sessão matutina dos sorrisos, vozes escolares, odor a incenso, jogos de sombras, cantos, encantos. Tudo retornou vida em 1998, quando a Sala Yago abriu com o jogo de prestidigitador à vista de teatro, títeres, cinema independente, ciclos… coração de tantos corações. E foi possível ao longo de nove anos, e foi impossível esquecer que a vida lateja longe de naufrágios desde então.
Apenas documentos judiciais de um desses enredos alheios aos seus navegantes, tão feios e complexos que nem sequer pagam a pena para estória, para além das actas judiciais que contam de uma empresa gestora quebrada com a que Cachirulo tinha o seu contrato de cessão e uns proprietários que desejaram aproveitar a quebra dos seus velhos sócios e recuperar paredes, sem tomar em conta as notas de concórdia, os mundos alternativos que pariram e que já não lhes pertencem… mas isso, por enquanto, não está nas leis nem é quantificado nos processos.
A Sala Yago ainda tem nome, protesta e sombra. As suas paredes negam-se a mudar de rua e propriedade. Por isso ainda ecoa e ainda existe.
Um destes dias vou recitar os versos da existência sob os arcos, ao pé das portas encerradas e convocarei músicos e actores, sonhadores todos, público e amantes… por que não? Em Junho a Solidão cumpre dois anos de triste moradora.

sexta-feira, 3 de abril de 2009

Mulheres

Caminhar em solidão dá a perspectiva distanciada do próprio e do alheio na máxima apropriação dos panoramas. Por isso necessito essa medida nalgum momento do dia e em qualquer circunstância.
Mais difícil é nas viagens colectivas deixar ao parceiro ou ao grupo inteiro para ser dona de um tempo.
Nessas “fugidas” acontecem as coisas mais esquisitas, que poderíamos contar e rir uma vez superados os momentos de confusão que às vezes se propiciam… e contaremos quiçá nalguma ocasião, mas por enquanto ficamos pelo tempo das decisões, das imposições e das mulheres.
A última viagem com grande grupo deu-se há poucos dias, numa dessas expedições magníficas com crianças, adolescentes e imaginários adultos que nos tornamos capitães múltiplos, cuidadores, informantes, proibidores, parceiros, multi-ideias, especialistas em tudo e todo-poderosos organizadores… sarilhos nos que entramos sozinhos, vivemos demasiado acompanhados e dos que saímos com saudades e lembranças, retornados aos próprios passados. Como sempre, a necessidade do tempo a só foi improvisando espaços em cada paragem rumo ao Al-Andalus e, desta vez, a responsabilidade artística dos mais de setenta actores e actrizes muito jovens, mas muito espertos e autónomos como é próprio do grémio, assim como o bom número de pessoas às que se nos supunha a seriedade mais pelos anos consumados que pelas vontades de assenta-la que os acompanhávamos, tornou possíveis e compreensíveis estas fugidas breves e produtivas as solidões achadas.
Foi numa delas, na cidade de Toledo, trás a visita à loja perdida de um comerciante marroquino que oferecia formosos orientes e na que recuperei o narguilé perdido numa estranha noite na Terra Verde; também trás um café em ambientes retornados a lembranças da última estadia com aquele olhar de amor que acompanhava e deixou as marcas mais profundas (que também poderão ser motivo de escrita nalguma altura talvez), o caso é que ali foi o retrato meditado e possível nos séculos e nos retornos: uma manhã feminina escrevia história múltipla nas ruas: idades, pesos, passos, cruzamentos, aspectos, estilos, crenças, atitudes, olhares, vestimentas… tudo diferente… mas duas daquelas mulheres partilhavam uma mesma touca sobre as cabeças. Num momento caminharam próximas e distantes, depois demonstraram os seus ritmos e destinos comuns na separação e a fotografia não chegou no primeiro tempo, porque quase nunca é instantânea, mas foi suficiente para captar as semelhanças mais diferentes: uma freira católica e uma senhora muçulmana mostravam a mesma disposição a cobrir os cabelos com um pano da mesma cor, de feitura e tecido emparentados.
As raízes e os mundos voltavam revoltados sobre as pedras de uma cidade que contemplara a convivência de três religiões e um mesmo mundo.
Espaventos, questão, escândalo, posicionamentos, lutas, diferencias, regulamentos… que aquelas mulheres ultrapassavam com a sua mesma simultaneidade na paz, no anonimato, na normalização. Apenas eu parecia perceber qualquer coisa estranha em meio de uma sociedade que vivia a realidade da coexistência na mais absoluta quotidianidade, e eu pretendia apenas captar os paralelos, por isso nem devia ser tomada em conta.
Afinal parece ser possível, parece que pode ser uma mesma a imposição ou a liberdade, mas parece que não andamos tão longe as umas das outras, que afinal estamos na mesma dicotomia sapiens sobre mostrar ou ocultar partes do nosso corpo e da nossa alma.
… E eu embuçava-me trás um caderno e uma câmara… Mas todas sabíamos tocar o vento com a mesma precisão de um ritmo místico e de um tempo profano por viver.

quinta-feira, 2 de abril de 2009

Janelas

De manhã há verde na vida. Imagino que torna perspectiva nova sair e pisar pura terra. Mas na tarde procuro a pedra de Compostela, essa cidade, povo, aldeia cosmopolita, urbe catedralícia, universal universidade, rua acima, conversa, encontro, passo adiante… à que irremediavelmente pertenço.
Nesta altura, Compostela é a sociedade, o braço ao abraço e também a solidão acompanhada, essa solidão ideal de café, mesa à janela, tempo de mouras a observar, quiçá um piano, visita longa, carícia certa, surpreso, reencontro… caderno de campo em campo de estelas e uma luz.
Moro ao pé do Pico Sacro. Cumpriram-se cinco anos de lupária na noite do São Lourenço. O Vale da Ulha Alta é raiz que se conforma. Compostela voa ao vento, ramo, flor, nave, versos de silêncio interior no rumor externo.
Janela de moura, olhar de idades na voz e na saudade.